REGINA DUARTE TEM MEDO DO QUÊ? Cara Regina, Surpreendeu-me sua participação, hoje, no programa gratuito eleitoral do candidato Serra, pregando o medo. Sua tentativa em dividir o seu medo com a Nação brasileira chega a ser patético. O seu medo de que Lula venha a ganhar as eleições, no próximo dia 27, é cômico se não fosse sério, parodiando Dürremath. Cômico, na medida em que imagina que a vida da maioria dos brasileiros seja tal qual a sua. Lamentavelmente, não é. A notoriedade da qual você, por mérito, desfruta não é vivenciada pela maioria da população brasileira. O que tem sido um terror para você (a vitória do Lula) para muita gente, quem sabe, seja a salvação. 39 milhões de pessoas depositaram em Lula a esperança de dias melhores; e isso não é pouco. Sério, porque há justo 27 anos, numa semana qualquer de outubro de 1975, você, com outros atores, participou de uma leitura de uma peça teatral, onde o que se via era acima de tudo coragem. Estou falando do Concerto nº 1 para Piano e Orquestra (teatro Paiol, segunda quinzena daquele outubro maldito). Numa sexta-feira à meia-noite, como uma nesga de esperança, atores como João José Pompeu, Madalena Nicol, Maria Ylma, entre outros, davam prova de que alternativa não havia, a não ser enfrentar com coragem a ditadura militar. Enfretamento que fazíamos com as únicas armas de que dispúnhamos, a nossa profissão, ainda que improvisados. O texto, escrito por João Ribeiro Chaves, cunhado de Vladimir Herzog, sacudiu a todos e nos encheu de esperança, não de medo. Na semana seguinte, ou no dia seguinte (existe uma divergência entre este que escreve e Sergio Mamberti, também diretor daquela leitura), Vlado foi morto nas dependências do DOI-CODI. Vlado esteve naquela meia-noite de sexta-feira assistindo a segunda leitura que falava de esperança, embora debaixo de pancada. Você, demonstrando ainda maior coragem quando tomou a frente e meses depois veio a montar a mesma peça, comercialmente, mantendo grande parte daquele elenco. Surpreendo-me, sinceramente, que nesse momento você lance dúvidas a respeito da idoneidade e importância histórica do ex-metalúrgico e hoje político mais importante do Brasil. A notoriedade de Lula foi conseguida com trabalho e seriedade, a mesma seriedade com que você pacientemente construiu seu prestígio, ao longo dos anos de sua carreira. Lula representa esperança e não retrocesso, o caos. Caos e medo é o que grande parte dos que nele votaram, dentre eles eu, têm vivido. Ele significa a mudança, a mesma mudança que um dia você ajudou a construir. Destaco você, ao lado de Lélia Abramo, Fernanda Montenegro, Camila Pitanga, Regina Case, Fernanda Abreu, Lilia Cabral, como um patrimônio cultural brasileiro que não pode ser destruído. Da mesma forma não é correto, com todo o respeito, que tente transformar uma pessoa como Lula, ao qual muitos de nós brasileiros devemos, num causador de caos maior. Até porque ele teve a coragem de enfrentar os militares, junto com seus companheiros metalúrgicos do ABC. Naquela época o combustível da vida era a busca da liberdade que hoje você desfruta e todos nós também desfrutamos. Hoje o combustível da vida é a luta pela igualdade de oportunidades que Lula também representa. Você fala que ele mudou, que não é mais o homem que você conheceu. A qual Lula você se refere? Aquele que mobilizou seus companheiros para votar em FHC para senador, em 78? Ou o Lula que comandou as greves contra o regime militar, nos anos seguintes? Nota-se que você conhece tudo de teatro e pouco de política. Permita-me, ele é o mesmo homem generoso com seus companheiros e com o destino da Nação Brasileira. Lula não renega seu passado, muito menos o que escreveu, até porque tudo o que escreveu o fez com a própria vida. Acho que apesar da tristeza que deverá cair sobre seu coração sensível - uma possível derrota de Serra no dia 27, você deve votar, sim, nele. É o seu direito. Acho mais, espero que nos próximos dias tenha a oportunidade de dizer o quanto ele, Serra, pode fazer pelo Brasil, como economista, por exemplo. Só lamento que nesses anos todos o seu partido do coração, governando o Brasil, não tenha usado seu candidato como economista. Sei que ele é muito competente como tal, porém, não foi capaz de evitar a situação que as notícias dos jornais diários não nos deixam esquecer. A crise econômica em que nos meteram. Acho ainda, para finalizar, que você despreza a inteligência dos eleitores, apelando para o coração sofrido de quem, em situação outra, poderia embarcar no seu medo. Regina, sua contribuição ao teatro, tevê, cinema e à cultura brasileira, enfim, não será esquecida. O seu gesto de hoje, eu espero que sim. Para o bem de todos nós! Respeitosamente, Jair Alves - Dramaturgo - São Paulo ©Copyright Recebi esse texto por e-mail, no dia 15/10/2002 com os seguintes créditos: Jair Alves - Dramaturgo - São Paulo. É a resposta à aparição da atriz no programa de campanha do candidato José Serra. ZAMORIM :: Textos :: http://zamorim.com/textos/reginaduarte.html |