Carta aos congressistas

Por Rogério Menezes
Brasília, 13 de fevereiro de 2001
Correio Braziliense


Senhores,

Numa dessas noites insones, entrei em sala-de-bate-papo-com-tema-livre na Internet, tentando encontrar vida inteligente àquela altura da madrugada. Utilizava o nickname Brasiliense 44. Ninguém se interessou em contracenar comigo. Já pensava em cair fora quando surgiu mensagem provocativa no vídeo: — Vc tá teclando de Brasília? Deve ser deputado ou senador corrupto? Certo?

Pensei em desligar, mas resolvi teclar umas palavrinhas com o cara: — Vc já esteve em Brasília?

O-cara: — Nunca. E nem pretendo ir. Aí só tem político ladrão roubando o patrimônio público.

Retruquei: — Não é verdade, tem muita gente honesta por aqui...

O-cara: — Conta outra, otário!

Antes que pudesse rebater as acusações, senhores, Cícero/27 — esse era o nickname do agressivo interlocutor — saiu da sala.

Fiquei com a acusação de Cícero/27 na cabeça. Resgatei-a da memória nos últimos dias, ao saber da série de golpes baixos que os senhores vêm se aplicando em nada-edificante-vale-tudo pela eleição para as presidências da Câmara e do Senado que acontece amanhã.

Ok, os experts em política dizem que (1) política e ética nem sempre rimam e que (2) a prática política exige certa dose de virilidade e de objetividade. Mas os senhores estão exagerando... Não podemos compactuar com os meios ilícitos, os grampos e as propinas — em dinheiro vivo ou em cargos públicos — que os senhores vêm utilizando para conquistar mais-e-maiores-poderes.

Desculpem a franqueza, senhores, mas para nós-simples-cidadãos-que-lutamos-bravamente-pela-sobrevivência, essa patuscada toda parece se resumir a ópera-bufa para provar quem rouba com mais, digamos, engenhosidade.

Certo deputado mineiro já falecido, em inesperado ataque de autocrítica, afirmou que tem de tudo no parlamento brasileiro: ladrões, honestos, canalhas e derivações — menos bobos.

Os bobos da corte somos nós, senhores, que votamos em vós nas últimas eleições.

Por vossa culpa, brasilienses-bons-cidadãos que pagam contas em dia e, no máximo, pecam contra a castidade e cobiçam a mulher do próximo, levam fama sem deitarem na cama.

Graças aos senhores e de gente da vossa laia, pessoas como Cícero/27 pensam que Brasília se resume ao jogo-sujo-em-busca-de-poder e que esta simpática urbe habitada por muita gente de boa índole é a materialização da corrupção.

A lama na qual os senhores chafurdam respinga em nós, brasilienses. E não estamos gostando nem um pouco disso.

PS. Criamos novo grupo de auto-ajuda no DF: os Inconformados-com-os-Desmandos-do-Congresso-Anônimos.



©Copyright   Esse texto foi escrito por Rogério Menezes, para sua coluna Crônica da Cidade, no Correio Braziliense, no dia 13 de fevereiro de 2001.

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